quinta-feira, 4 de setembro de 2008

Plano de Ordenamento Turístico dos Açores e os Estatutos do Turismo do Algarve


Importa eliminar o garrote político de um financiamento essencialmente dependente da contratualização, abrindo uma brecha nesse asfixiante centrALLismo que tudo controla e condiciona.

1) POTRAA

Foi recentemente publicado o Decreto Legislativo Regional nº 38/2008/A, de 11 de Agosto, que aprova o Plano de Ordenamento Turístico da Região Autónoma dos Açores.

Sob a égide da sustentabilidade e de um conjunto de objectivos enunciados no preâmbulo, estamos perante um plano sectorial de âmbito regional, um instrumento de gestão com incidência territorial – o PENT tendo o mesmo horizonte temporal (2015) não possui esta importante característica – composto por normas de execução (anexo I), o relatório (anexo II) e as plantas síntese (anexo III).

Os conceitos de empreendimentos turísticos que subjazem ao POTRAA são, no entanto, moldados na legislação de 1997 – a trilogia do alojamento turístico: empreendimentos turísticos, turismo no espaço rural e turismo de natureza – e não na recente legislação dos empreendimentos turísticos, aprovada em Março de 2008, em que aquelas três realidades se fundem num só conceito, para além de o turismo de natureza perder a sua marca característica de sustentabilidade ambiental e passar a abranger todas as tipologias, sem excepção, mesmo as que implicam uma maior carga e consumo de solo.

A questão seria inócua se a alteração de 1997 para 2008 respeitasse tão somente a moradias turísticas ou motéis, sub-tipologias não consagradas ao nível regional, mas o turismo no espaço rural, que constitui agora um dos tipos de empreendimentos turísticos, já não comporta o limite de trinta quartos ou suites nos hotéis rurais e o turismo de natureza foi muito desfigurado.

De forma pioneira, introduz-se um preceito (o art.º 6º) consagrando expressamente o conceito de capacidade de carga turística, estabelecendo-se a partir do número de camas existentes em cada uma das nove ilhas em 2005 (no total 8093), o número máximo por ilha a atingir até 2015, o que perfaz na totalidade 15.500 camas.

Para além deste limite estabelece-se uma reserva adicional de 10% (1.551 camas também dividas por ilha) para obviar às dinâmicas de crescimento insusceptíveis de previsão a esta distância e ou projectos com especial significado estratégico.

Par maiores desenvolvimentos sobre esta matéria, conferir na secção Opinião do site do Publituris, o meu texto publicado em 13 de Agosto de 2008.

Em suma, um excelente instrumento de gestão territorial que pela sua qualidade estratégica e grau de fundamentação constituirá certamente um marco no ordenamento do território turístico português, ao nível do que melhor se faz por esse mundo fora. Uma grande densidade técnico-política reforçada pela ausência de paradigmas tão em moda como o papel estruturante das companhias aéreas low cost ou do turismo residencial.

2) Entidade Regional do Algarve supera ao nível estatutário as limitações do novo modelo turístico regional em matéria de atribuições e competências

Um primeiro comentário relativamente à Portaria n.º 936/2008, de 20 de Agosto, a qual aprova os Estatutos da Entidade Regional de Turismo do Algarve (EERTA) a maior região turística do país vê, num gesto político pleno de significado, os seus estatutos serem publicados em primeiro lugar – que adopta a denominação de Turismo do Algarve.

A nova lei das entidades regionais de turismo (Decreto-Lei nº 67/2008, de 10 de Abril = LERT) prevê vários aspectos de relevância que serão conformados ao nível estatutário.

Um dos aspectos, é precisamente a criação de competências das entidades regionais de turismo ao nível estatutário, ou seja, outras competências para além daquelas – muito poucas, praticamente inexistentes – que se encontram vertidas na LERT (art.º 3º, nº 1).

O nº 1 do art.º 3º EERTA concretiza a valorização da área regional de turismo através da qualificação do território, da promoção e da dinamização do destino, enfatizando a cooperação com os sectores público e privado, por forma a beneficiar a economia e a qualidade de vida da região e do País.

É, porém, o nº 2 do art.º 3º EERTA que amplia consideravelmente o elenco de atribuições da Turismo do Algarve, bastando para o efeito cotejar as incipientes alínea a) a d) do nº 2 do art.º 5º da LERT.

Definir uma estratégia para o sector turístico, coerente com as orientações do Plano Nacional para o Turismo, a operacionalização eficaz do Plano Regional de Turismo numa perspectiva de compatibilização com o plano nacional, a elaboração os planos de acção promocional, constituem significativas inovações operadas ao nível estatutário.

A promoção é uma das formas através das quais se opera a valorização turística do território (art.º 3º, nº 1) que incumbe aos novos entes regionais de turismo, aludindo-se inclusivamente numa inédita precisão ao reforço da promoção no mercado interno através de acções de grande visibilidade e impacte.

Não tendo a LERT instituído o princípio da força dominante dos municípios, os estatutos consagram-no relativamente aos membros fundadores: 16 municípios e outros tantos representantes de entidades públicas ou privadas (art.º 4º, nº 1).

Um bom trabalho em prol do regionalismo turístico que cumpre a aprofundar e aplaudir. Na esteira, aliás, duma recente reunião do ITP em que António Pina, apesar da inequívoca solidariedade partidária, mostrou que não aceita que o crescente e asfixiante centralismo subjugue os interesses regionais, tendo vindo mais recentemente a terreiro com a clarificação do aspecto da animação.

Há agora que encontrar formas de eliminar o garrote político decorrente de um financiamento essencialmente dependente da contratualização anual, abrindo uma decisiva brecha nesse centrALLismo que tudo controla e espartilha, designadamente o plano regional da administração pública do turismo português.

3) O princípio da estabilidade política

Independentemente do maior ou menor grau de frustração que tenha suscitado a não concretização de um dos cíclicos boatos da saída de governantes, é positivo que não tenha ocorrido a saída de Bernardo Trindade durante Agosto.

Para o bem e para o mal, responde pelo quadriénio. O que poderia fazer e com que credibilidade outro titular da pasta, a cerca de um ano das eleições e com a regulamentação da principal legislação em preparação ou a ser publicada? O que poderia e deveria mudar, que condições teria?

A razão principal é, assim, a estabilidade política, existe um horizonte temporal para a concepção e implementação de um programa, devendo o titular dispor do indispensável tempo político. Podia ter arrancado mais cedo, fazer de outra maneira, isso é matéria de balanço da governação a realizar daqui a alguns meses. Para o afastamento político só devem relevar circunstâncias excepcionais.

A estabilidade política da governação do turismo – um dos grandes indicadores da performance governativa com a vantagem de se medir objectivamente pelo simples decurso do tempo – é afinal um dos mais preciosos trunfos políticos do PS contrastando, assim, com a meteórica sequência Pedro de Almeida, Correia da Silva – dois grandes valores que não tiverem ensejo de pôr no terreno a sua visão política de conformação do turismo – e Telmo Correia.

Carlos Torres
Advogado
Publituris nº 1036, 29 de Agosto de 2008