De forma semelhante aos anos sessenta e oitenta, após a actual crise internacional ocorrerá um novo surto de expansão do turismo português? Tal como os surfistas atentos e robustamente preparados apanharemos no momento próprio a onda teorizada por Schumpeter?
1) A tendência de forte expansão do turismo português após grandes crises internacionais
As guerras e as grandes crises económicas estão associadas a subsequentes momentos de forte progresso da humanidade.
Também no campo particular da actividade económica do turismo em Portugal, embora pela sua relativa juventude não sejam possíveis grandes avaliações retrospectivas, podemos detectar uma tendência de a períodos de forte contracção e de negras perspectivas se seguir a expansão e a bonança económica.
Na década de sessenta, refeitas as economias dos países flagelados pelo segundo conflito mundial e a generalização do direito a férias pagas, surge o boom que permite o nascimento do nosso turismo como actividade económica relevante por forma a obviar às crescentes despesas com a guerra colonial.
Não se trata, no entanto, de mera inspiração política ou de um crescimento espontâneo induzido por determinados recursos naturais, antes resultando do prévio estudo de reputados especialistas internacionais fundamentando as subsequentes grandes opções políticas, que surpreendentemente recaíram sobre uma desprezada parcela do território nacional.
Quando o presidente Américo Thomaz questionado pelo empresário indeciso sobre a cultura a implementar recomendava, para surpresa dos presentes, que nos terrenos da Penina que se avistavam no horizonte se plantasse um hotel, já se encontrava profundamente estudado um novo destino turístico nascido das recomendações científicas de dois dos maiores especialistas internacionais da época – Kurt Krapf e Oscar Michel.
Com efeito, em 1962, estes especialistas – o Algarve registava então 52 000 dormidas, ocupando um 7º lugar no conjunto dos distritos e tão somente 2,5% do total das dormidas – apontavam para que no desenvolvimento turístico português se conferisse uma clara prioridade ao Algarve porquanto, no seu entendimento, era a região que apresentava “melhores condições de atracção e de acolhimento das grandes correntes de visitantes” (Développement du Tourisme au Portugal, rapport d´expertise).
Quem no plano nacional, fosse no político ou no empresarial, compreendia então as potencialidades de um produto turístico denominado sol e praia? E como se poderia antever que um território que não despertava o interesse dos próprios nacionais passasse a acolher, em menos de uma década, o estrelato internacional e para ele se virassem as atenções do investimento internacional, ultrapassando um milhão de dormidas em 1970, arrecadando o 2º lugar?
Só pelo estudo aprofundado foi possível a tomada de decisões políticas de enorme importância, designadamente a do Aeroporto de Faro que causou grande surpresa em termos internacionais pelo escasso triénio que mediou entre a aprovação e a sua inauguração em 1965.
Ao segundo conflito mundial seguiu-se outro momento de forte perturbação, a crise internacional decorrente do choque petrolífero de meados da década de setenta associada à turbulência interna decorrente da Revolução de 1974 em que até o pungente fluxo de retornados servia de tábua de salvação às preocupantes quebras de ocupação hoteleira.
Numa surpreendente recuperação do nosso turismo, seguiu-se na década de oitenta um período de fortíssimo e de inolvidável crescimento, passando Portugal a figurar nos primeiros quinze destinos mundiais, vantagem competitiva ímpar numa economia incipiente, até há pouco vertebrada no proteccionismo tutelar do Estado a um punhado de grandes grupos económicos.
Com efeito, tirando a Grécia, as taxas de crescimento entre 1978 e 1987 não tiveram equivalente em qualquer outro país da Europa, sendo que, durante a década de oitenta, o ingresso de turistas cresceu o triplo das entradas verificadas a nível mundial.
É, assim, importante que a seguir à grande crise de 2008 - ? o turismo português registe um terceiro movimento fortemente expansionista, por forma a que possamos recuperar alguns lugares perdidos no ranking mundial de chegadas e/ou subamos alguns no de receitas.
Para isso há que estudar aprofundadamente e de um ponto de vista multidisciplinar os produtos turísticos a manter e a criar, os territórios a afectar preferencialmente de harmonia com as previsíveis tendências de evolução de um mundo que se deverá nortear por princípios de maior rigor e de desenvolvimento sustentável, a adequação de um modelo de sol e praia sedimentado num trio de núcleos territoriais, dependente de operadores turísticos ou de sucedâneos como as low cost, o crescente abandono da vertente hoteleira e a forte penetração dos interesses imobiliários, qual o peso relativo do turismo receptor e da desprezada vertente doméstica. O leque de matérias é vasto mas temos que estar preparados para que, tal como na década de sessenta e de oitenta, o nosso turismo possa, com grande sucesso, aproveitar o movimento de retoma internacional quando este se perfilar no nosso horizonte.
2) O princípio da prevalência no aproveitamento das edificações existentes
A crescente betonização é um dos aspectos a ponderar, inflectindo a tendência de construção de novos edifícios.
Em Inglaterra, onde vigora de um dos mais avançados sistemas de planificação turística, dispõe-se especificamente sobre esta actividade como importante fonte de receitas sem prejuízo da necessidade de preservar as condições do meio rural. Deste modo, interditam-se ou restringem-se fortemente as novas construções para afectar ao turismo, optando-se pela política de reconversão de antigas instalações.
Pioneiramente na Lei da Utilidade Turística (Decreto-Lei nº 423/83, de 5 de Dezembro) o legislador reconhece expressamente que a remodelação, beneficiação ou reequipamento constituem iniciativas muitas vezes mais úteis e merecedoras de estímulo do que a construção de empreendimentos novos.
Uma das razões será certamente a ausência ou o menor consumo de solo decorrente daquelas iniciativas, numa linha da legislação do turismo orientada para o desenvolvimento sustentável, que regista alguns afloramentos posteriores como o da recente legislação dos empreendimentos turísticos em que o aproveitamento das construções existentes confere a pontuação máxima (15 pontos) no âmbito de um novo sistema de classificação dos hotéis, apartamentos e aldeamentos turísticos (Portaria nº 327/2008, de 28 de Abril).
Os futuros planos de ordenamento turístico poderão limitar as novas licenças à utilização das edificações existentes ou até a empreendimentos em funcionamento com incremento obrigatório da classificação, logo que se atinja uma determinada percentagem da capacidade de carga.
In Publituris nº 1072, de 22 de Maio de 2009, pág. 6