terça-feira, 30 de novembro de 2010

Planeamento do turismo: notas introdutórias

Podemos afirmar que o ponto cardeal do planeamento turístico é o desenvolvimento sustentável desta actividade económica que representa actualmente cerca de 10% do PIB e 11% do emprego, tornando-se assim uma das mais promissoras para o nosso futuro colectivo.

1. Introdução

Não obstante a vocação natural do nosso país para o turismo, assente num clima ameno e numa acentuada diversidade de recursos naturais ao longo de uma pequena extensão territorial, a actividade não se desenvolve por si própria, antes carece de orientação firme e ininterrupta envolvendo, de forma participada, cidadãos e empresas, orientação o mais possível consensual e imune às flutuações político-ideológicas associadas às mudanças governamentais ou da administração pública do turismo.

2. O desenvolvimento turístico sustentável como orientação mestra

Podemos afirmar que o ponto cardeal do planeamento turístico é o desenvolvimento sustentável desta actividade económica que representa actualmente cerca de 10% do PIB e 11% do emprego, tornando-se assim uma das mais promissoras para o nosso futuro colectivo.

As despesas realizadas pelos turistas criam uma reacção em cadeia que produz benefícios económicos adicionais e têm um impacto positivo nas populações locais. No entanto, pode existir a necessidade de empregar técnicas específicas para aumentar esses benefícios.

Apesar da criação de riqueza e de emprego ao nível nacional e internacional é apontada a pouca atenção que os governos lhe têm dispensado e o excessivo enfoque no equilíbrio na balança de pagamentos.

Os objectivos do turismo sustentável são, de forma sucinta, os seguintes:
  1. Melhorar a qualidade de vida das populações;
  2. Oferecer ao visitante uma elevada qualidade de experiências;
  3. Manter a qualidade ambiental da qual dependem não apenas as populações locais mas também os fluxos turísticos.
O desenvolvimento sustentável não é um processo rígido mas sim em constante mutação em que as alterações na exploração dos recursos, na gestão dos investimentos e nas orientações ao nível institucional são geridas coerentemente atendendo não apenas às necessidades actuais mas também às futuras, isto é, numa perspectiva intergeracional identificada no relatório Brundtland.

A componente da sustentabilidade ambiental do turismo deve preceder a componente económica.

3. As vantagens do planeamento

A experiência demonstra que, por esse mundo fora, os territórios turísticos objecto de planeamento têm-se desenvolvido melhor mantendo a satisfação dos seus visitantes enquanto outros onde não teve lugar enfrentam problemas ambientais e sociais, os quais afectam os residentes e dissuadem os turistas ocasionando problemas no mercado e reduzindo as receitas.

Com efeito, existe uma diferença significativa entre o desenvolvimento incontrolado – em que se geram imprevisíveis e nefastos impactos – e o desenvolvimento planeado dos destinos turísticos. É certo que os primeiros podem ser objecto de um plano de recuperação mas as intervenções correctoras implicam significativas perdas de tempo e dinheiro.

De alguma forma, a ausência de planeamento pode explicar-se pela circunstância de nalguns países o turismo ser ainda uma actividade económica recente em que falta experiência por parte dos governos e da iniciativa privada.

4. Níveis de planeamento do turismo

O planeamento do turismo nos diferentes níveis, internacional, nacional, regional e local, é essencial para o seu adequado desenvolvimento e gestão.


Com efeito, o turismo deve ser objecto de planeamento ao nível nacional e regional fixando-se as políticas adequadas, os aspectos estruturais e os factores institucionais indispensáveis a um correcto desenvolvimento e gestão.

Com o enquadramento do planeamento nacional e regional do turismo estabelece-se a base para o desenvolvimento de outros planos com maior detalhe designadamente o urbano e o rural, resorts e outras formas de turismo.

O princípio da proximidade aponta para que os cenários do desenvolvimento do turismo concretizados através de um planeamento racional e tecnicamente elaborado devam estar o mais próximo possível das comunidades locais que dele beneficiam assegurando a partilha das suas vantagens económicas, sociais e ambientais.

5. A selecção dos territórios turísticos

Estando o turismo associado a espaços qualificados interessa alargá-lo a outras partes do território para além da tradicional trilogia Algarve, Lisboa e Madeira de molde a que outras populações possam dele desfrutar.

No entanto, o turismo não é viável ou desejável em todos os pontos do território.

A diversificação territorial do turismo não significa estendê-lo à totalidade do território. Uns locais não têm aptidão enquanto outros devem ser preservados, constituindo uma espécie de reserva natural interdita à actividade turística.

Em suma, há que apurar os territórios que possuem os indispensáveis recursos naturais e culturais bem como o capital humano e a existência de mercados que os possam procurar, se a actividade é indispensável para atingir os objectivos de desenvolvimento dessa região e se são justificados os investimentos em acessos e infra-estruturas e, por fim, quais as ofertas concorrentes, seja no plano nacional ou no internacional.

O turismo deve ser visto como um sistema em que se inter-relacionam factores da oferta e da procura.


O ambiente, a ecologia e a economia surgem progressivamente inter-relacionados seja no plano regional e nacional como até no internacional, numa complexa rede de causas e efeitos. A degradação da qualidade ambiental e a perda de identidade cultural estão associados à diminuição dos fluxos de visitantes e à quebra de receitas.

6. Proximidade e metodologias bottom-up

As tendências mais modernas apontam o carácter essencial da participação das populações residentes nas decisões de planeamento e gestão do turismo, designadamente ao nível dos stakeholders, cidadãos e grupos de interesses ligados aos diferentes sub-sectores do turismo como também aos ligados à defesa do ambiente.

Deste modo os empresários e trabalhadores do sector, cidadãos residentes e defensores do ambiente devem ser periodicamente consultados não apenas sobre a construção mas também sobre o desenvolvimento do modelo turístico.

De uma visão de separação de interesses ou mesmo de antagonismo entre estes grupos há que assumir activamente a complementaridade e convergência de pontos de vista. Com efeito, se os elementos da comunidade sentem que são ouvidos e envolvidos nas decisões que respeitam aos seus interesses, aumenta a sua motivação e grau de responsabilidade.

A segmentação do mercado significa que as diferentes categorias de potenciais visitantes são objecto de uma divisão por modelos demográficos (idade, rendimento, proveniência), interesses especiais ou preferências.

7. Componentes da oferta turística

Seria fastidioso e porventura irrealizável enumerar num artigo desta natureza as diferentes componentes da oferta turística. Para efeitos de planeamento turístico optei pelo esquema seguinte em que é dado um forte destaque às tipologias dos empreendimentos turísticos porquanto a penetração do turismo em determinados territórios pode depender da tipologia em razão dos condicionamentos decorrentes dos instrumentos de gestão territorial.


8. A multiplicidade de usos

O planeamento turístico pressupõe a resolução de conflitos entre a localização de diferentes tipos de investimento, a opção pelo mais adequado e ainda uma perspectiva multi-usos das infra-estruturas de molde a servirem a comunidade e os turistas.

Segundo Edward Inskeep, um dos princípios do planeamento turístico aponta para sempre que possível as infra-estruturas e equipamentos proporcionem múltiplos usos, servindo não apenas os turistas mas a generalidade dos cidadãos.

Um bom exemplo da aplicação deste princípio vem do município espanhol de Múrcia que acaba de aprovar a construção de um jardim público de molde a que um hotel que está a ser construído nas imediações se valorize tornando-se mais atractivo para os seus potenciais clientes.

Por seu turno, o hotel da cadeia NH suportará metade dos custos de construção da zona verde com a área aproximada de três campos de futebol, um espaço até agora utilizado pelos feirantes que chegavam à cidade, tendo para o efeito modificado o Plan General Urbano de la ciudad de Murcia.

O turismo ao serviço da revitalização das cidades permitindo a qualificação dos seus espaços públicos que ficarão adstritos à utilização dos seus cidadãos e dos turistas que as visitam.

Muito ganhariam os turistas e os cidadãos de Lisboa com uma solução similar para os terrenos da antiga Feira Popular, os quais se encontram numa degradação crescente designadamente a prostituição ostensiva no seu interior.

O planeamento em turismo deve ser encarado como um processo flexível e contínuo.

9. Etapas do planeamento do turismo

Seriam possíveis várias esquematizações do planeamento do turismo. Dada a sua experiência internacional e a ligação a vários estudos no âmbito da OMT optei pela de Inskeep.


Jornal Planeamento e Cidades nº 23, Novembro/Dezembro 2010, pp. 26-27

A proliferação da fiscalidade no turismo

A escolha dos destinos turísticos pode ser influenciada por pequenas flutuações de preços imputáveis à componente fiscal. De harmonia com a OMT é preferível uma fiscalidade baseada numa percentagem do valor de consumo (ex: IVA) e não num valor fixo de taxas turísticas específicas.

1) Correcção do mercado e obtenção de receitas

A máxima de Benjamin Franklin segundo a qual só há duas certezas na vida, a morte e os impostos, não sofre excepção no turismo.

Tal como na maioria dos casos, os impostos ou taxas de turismo são cobrados por duas razões principais: para corrigir falhas de mercado (situação de monopólio, consumo de bens públicos e externalidades) e/ou gerar receitas.

Vários estudos referem que muitos países se encontram numa situação de monopólio sobre o turismo internacional mercê da natureza diferenciada dos seus produtos. Tal diferenciação do produto turismo decorre dos tipos e qualidade dos atractivos, bens e serviços existentes no país.

Distingue-se entre o turismo wanderlust, no qual se vê ou faz algo que é exclusivo do destino, e o turismo sunlust, que se refere aos destinos sol e mar. O primeiro tende a apresentar um maior grau de diferenciação do produto e, consequentemente, um maior poder de mercado, gerando substanciais benefícios económicos que uma vez captados pela tributação são usados para corrigir a deficiente distribuição de recursos.

O forte crescimento do turismo tornou-o apetecível para os governos, sobretudo na componente do turismo internacional pois cifrando-se numa tributação das exportações não causa impactos eleitorais, uma vez que o turista cidadão estrangeiro não vota no país que o tributa e, também, pela facilidade de arrecadação do imposto (aquisição da passagem de avião, na entrada do aeroporto ou no pagamento da factura do hotel).

A tributação também pode ser usada para resolver as externalidades, que incluem o aumento do congestionamento nas estradas e a degradação ambiental. A investigação da fiscalidade no turismo mostra-nos que, nalguns casos, o impacto prejudicou a actividade e noutros as verbas arrecadadas acabaram por ser inferiores às que se registaram antes do lançamento do imposto.

2) Sensibilidade aos preços

O sector do turismo caracteriza-se por uma elevada sensibilidade aos preços, na medida em que o consumidor dispõe de uma vasta gama de produtos que pode comprar. Uma pequena variação poderá provocar alterações nos destinos.

Num estudo da British Tourist Autorithy a elasticidade dos preços em matéria de férias é de – 1,5%, o que equivale a dizer que um corte de preços de cerca de 10% provocaria um aumento de 15% na procura turística.

3) Fragilidade

Não obstante a sua dimensão mundial e forte crescimento o turismo apresenta algumas fragilidades, designadamente um elevado número de empresas de pequena dimensão, tendência para modas efémeras e carácter perecível do produto turístico, imprevisibilidade da procura e elevada sazonalidade.


4) Conclusões gerais da Organização Mundial do Turismo
  1. A fiscalidade é um importante instrumento das economias modernas, um meio necessário para disponibilizar verbas para o investimento em infra-estruturas e serviços requeridos pelo turismo.
  2. Não obstante, a indústria do turismo está sendo afectada por um número crescente de impostos sem atender à carga fiscal já existente e aos seus efeitos na distorção da concorrência.
  3. A imposição de encargos discriminatórios ou não equitativos pode afectar a competitividade do sector, não apenas relativamente a outras indústrias mas também a destinos concorrentes.
  4. Os impostos lançados sobre o turismo são, nalguns casos, de difícil justificação. Apesar do quantum tributário em termos absolutos ser pequeno ele é importante no contexto da viagem no seu conjunto. A aplicação destes impostos tem demonstrado um efeito sobre a procura (e, assim, um impacto ulterior indirecto sobre as actividades económicas do apoio ao turismo).
  5. É necessária uma cuidadosa observação dos governos relativamente a todos os impostos (v.g. IVA) que afectam o turismo evitando que se produza um efeito cumulativo negativo na procura turística (União Europeia e as diferentes taxas de IVA para o alojamento e restauração e a questão do regime especial da margem para os agentes de viagens).
  6. O importante é apurar onde reside o ponto de equilíbrio entre a potenciação da procura e dos ingressos fiscais e a arrecadação de impostos para financiar o investimento.
  7. Evitar a aprovação de impostos sem a antecedência necessária para que os operadores turísticos e o canal de distribuição os possam reflectir nos preços.
  8. São necessários estudos mais detalhados para medir e quantificar o impacto que as modificações da fiscalidade do turismo tem sobre o sector e a economia no seu conjunto.
  9. O senso comum é uma preciosa ajuda pois a proliferação de impostos numa indústria em expansão dificulta o seu desenvolvimento e funcionamento.
  10. 10) Procurar um imposto razoável, facilmente aceite pelos destinatários e de fácil arrecadação. Actualmente, se os impostos não forem neutros e eficientes poderão distorcer a concorrência e prejudicar a competitividade relativa do país ou região.
  11. Tomar em consideração as diferentes situações do turismo internacional e fiscalidade, bem como as condições locais.
  12. Analisar a equidade, neutralidade e custo de arrecadação do imposto e o seu impacto económico no emprego e na distorção da concorrência.
5) Nota final: a distinção entre taxa e imposto e a constituição de um fundo de garantia

No âmbito da discussão das alterações à lei das agências de viagens motivadas pela implementação da Directiva Bolkestein, cujo texto foi recentemente apresentado à APAVT, sobressai a proposta da constituição de um fundo de garantia em substituição do actual sistema de caução.

A ideia já tinha sido aflorada pelo Dr. Luís Patrão quando foi ouvido na AR a propósito do caso Marsans, apresentando-se agora com contornos muito preocupantes. Embora o texto não esteja disponível no site do TP ou da SET – na linha do secretismo legiferante que infelizmente vem caracterizando esta governação do turismo –, aparentemente propõe-se que todos os agentes de viagens e operadores turísticos deverão contribuir com 1% da sua facturação do ano anterior, sem um limite máximo mas com um limite mínimo de 12 500€. O sistema não é restrito ao campo das viagens organizadas (vulgo pacotes turísticos) abrangendo indiscriminadamente todos os serviços prestados pelas agências e, pasme-se, a contribuição das empresas seria sempre em dinheiro excluindo-se, assim, instrumentos mais flexíveis como as garantias bancárias.

Sabendo-se que, a uma das maiores crises económicas de que há memória, estas empresas ainda têm de somar as profundas alterações do acesso ao mercado ditadas por Bolkestein, a proposta é de uma insensibilidade gritante e de uma total desadequação.

Existindo actualmente um sistema de garantias – caução e seguro de responsabilidade civil – que observa a Directiva 90/314/ CEE porquê alterá-lo? Se não existem garantias quando um consumidor adquire directamente um bilhete numa transportadora aérea que entra numa situação de insolvência ou quando obtém serviços pela via crescente do dynamic packaging porquê agravar a situação de muitos agentes de viagens em que a renovação anual da caução tem vindo a depender, nalguns casos, de hipotecarem a sua casa ou outros imóveis pessoais?

A inexistência de um limite máximo tem como consequência a penalização dos operadores turísticos nacionais relativamente aos seus concorrentes, sobretudo os espanhóis, os quais de harmonia com a Directiva dos Serviços podem livremente estabelecer-se e exercer a sua actividade em Portugal apenas com as garantias decorrentes da sua legislação que cumpre os parâmetros da Directiva 90/314/CEE. Também as PME são afectadas, bastando atentar que o montante mínimo (12 500€) significa voltar a pagar a taxa do alvará: ainda para mais com a ironia de tal acontecer justamente quando o mercado é indiscriminadamente aberto a todos os prestadores de serviços.

Retomo agora a proposta que tal fundo, a formar-se, assente fundamentalmente numa parte substancial das taxas que o TP vem cobrando pela constituição de agências de viagens e sucursais de operadores europeus ao abrigo da Portaria n.º 784/93, de 6 de Setembro, em que o Estado se terá apropriado ilegitimamente de milhões de euros. Com efeito, na taxa, diferentemente do imposto, existe um nexo de reciprocidade, constituindo o pagamento de um serviço prestado pelo Estado tratando-se, por essa circunstância, de uma remuneração manifestamente desproporcionada dado o baixo custo administrativo da verificação formal dos requisitos de que depende a emissão de um alvará para o exercício da actividade das agências de viagens e turismo. A desproporção da verba auferida pelo TP é acentuada pelo incumprimento da obrigação que impende sobre a autoridade turística nacional, desde 2007, da disponibilização no seu sítio da internet, do registo das agências de viagens licenciadas e do substancial atraso com que são proferidas as decisões da comissão arbitral.

A ponderação desta questão do custo desproporcionado, na primitiva versão da lei das agências de viagens terá levado, em 1997, à previsão de que uma parte da taxa fosse aplicada em instituições de apoio ao agente de viagens, intenção legislativa que inexplicavelmente nunca foi levada à prática. A ser constituído o fundo de garantia é uma boa ocasião para o Estado, como pessoa de bem, devolver ao sector das agências de viagens uma verba muito significativa que ilegitimamente lhe cobrou, beneficiando igualmente os consumidores portugueses. A quantificação é muito simples, bastando verificar o número de alvarás que foram emitidos quer de agências de viagens nacionais quer de sucursais europeias.

Doutro modo, aos devastadores efeitos no sector da Directiva Bolkestein seguir-se-ia um sugante e letal fundo de garantia Frankestein.

Viajar, 27 de Novembro de 2010

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

A transposição da Directiva Bolkestein

Na sequência da liberdade de circulação de pessoas, mercadorias e capitais consagra-se agora outro dos pilares da União Europeia, a livre prestação de serviços.

O Decreto-Lei n.º 92/2010, de 26 de Julho, vem estabelecer os princípios e as regras necessárias para simplificar o livre acesso e exercício das actividades de serviços e transpõe a Directiva n.º 2006/123/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de Dezembro, vulgarmente conhecida por Directiva Bolkestein ou Directiva dos Serviços.

O diploma tem como objectivo fundamental a fixação dos princípios e das regras necessárias para simplificar, no território nacional, o livre acesso e exercício à actividade de serviços (art.º 1.º/1) excluindo-se do seu âmbito as que sejam desenvolvidas com gratuitidade, ou seja, apenas relevam as que tenham contrapartida económica (art.º 3.º/1).

1) Âmbito objectivo e subjectivo

O âmbito subjectivo inclui prestadores de serviços estabelecidos em Portugal ou noutro Estado-membro da União Europeia ou do Espaço Económico Europeu, sejam pessoas singulares ou colectivas.

No âmbito objectivo enquadram-se as actividades de serviços desenvolvidas com carácter remunerado e que sejam oferecidas ou desenvolvidas em Portugal. São abrangidos os serviços aos consumidores, como os desenvolvidos no domínio do turismo, incluindo os guias turísticos, os serviços de lazer, os centros desportivos e os parques de atracções. Com carácter exemplificativo (o legislador limita-se a enumerar alguns exemplos) surge-nos no final do diploma um anexo com uma listagem de actividades. Algumas delas respeitam ao turismo, a saber:


Estão abrangidos vários tipos de serviços:

1) Os que pressupõem proximidade entre prestador e destinatário;
2) Serviços que impliquem uma deslocação do destinatário ou do prestador;
3) Serviços que possam ser fornecidos à distância.

Existem, porém, serviços aos quais não é aplicável o diploma, que se encontram excluídos do seu âmbito de aplicação (art.º 3.º/3), como sucede nos serviços financeiros e de seguros, transporte aéreo e aeroportuários.

2) O livre acesso e exercício das actividades de serviços

O princípio fundamental fixado no art.º 49.º do Tratado de Roma no qual se determina que as restrições à livre prestação de serviços na Comunidade serão proibidas relativamente aos nacionais dos Estados-membros estabelecidos num Estado da Comunidade que não seja o do destinatário da prestação surge-nos agora no art.º 4.º, que consagra igualmente a liberdade de estabelecimento.

De harmonia com estes dois estruturantes princípios os prestadores de serviços – quer as pessoas singulares ou colectivas nacionais quer as sedeadas noutro Estado-membro – podem livremente estabelecer-se e exercer a sua actividade em território português, designadamente através da criação de sociedades, sucursais, filiais, agências ou escritórios fazendo-o em regra sem necessidade de qualquer permissão administrativa ou até de uma mera comunicação prévia. No entanto, apesar da regra ser a desnecessidade de permissão administrativa ou comunicação prévia consagram-se algumas excepções no capítulo III (artigos 8.º a 18.º) que se traduzem num duplo condicionalismo: situações em que a lei preveja tal permissão administrativa e a mesma possa ser estabelecida (art.º 4.º/1).

3) Situações de excepção em que se mantêm as licenças, autorizações, validações e outras permissões administrativas no acesso ou exercício da actividade de serviços

O capítulo III (artigos 8.º a 18.º) disciplina a matéria das permissões administrativas para acesso ou exercício das actividades de serviços – licenças, autorizações, validações, autenticações, certificações, actos emitidos na sequência de comunicações prévias com prazo e registos – ou seja, situações em que uma actividade de serviços não pode ser prestada livremente ou através de uma mera comunicação prévia as quais ficam, no entanto, sujeitas de harmonia com o n.º 3 do art.º 8.º a um exigente conjunto de princípios.

4) Exclusão de alguns estabelecimentos da actividade termal

No capítulo VII alteram-se normas de alguns regimes sectoriais – outros como o das agências de viagens e empresas de animação turística serão desenvolvidos em diploma autónomo. Em primeiro lugar os estabelecimentos que não tenham fins de prevenção da doença, terapêutica, reabilitação e manutenção da saúde, os quais se dedicam exclusivamente a finalidades estéticas, à beleza e ao relaxamento. Opera-se a exclusão da disciplina da actividade termal (Decreto-Lei n.º 142/2004, de 11 de Junho) passando a ser considerados equipamentos de animação turística sendo-lhes aplicável o regime previsto no Decreto-Lei n.º 108/2009, de 15 de Maio.

§ Em termos gerais:

A) Para além das agências de viagens, a Directiva Bolkestein, agora transposta pelo Decreto-Lei n.º 92/2010, de 26 de Julho, abrange outras actividades de relevo para o turismo como o rent-a-car, a animação turística/operadores marítimo-turísticos e os estabelecimentos de restauração e bebidas.

B) Os estabelecimentos que não tenham fins de prevenção da doença, terapêutica, reabilitação e manutenção da saúde, os quais se dedicam exclusivamente a finalidades estéticas, à beleza e ao relaxamento são excluídos da disciplina da actividade termal passando a ser considerados equipamentos de animação turística.

§§ Consequências previsíveis:

A) Perturbação do mercado: Uma fase inicial em que o mercado das empresas de turismo será invadido por múltiplos agentes económicos sem a preparação adequada e acentuando-se a guerra de preços.

B) Empresas de outros países: Empresas de outros Estados-membros designadamente os operadores turísticos instalando-se livremente em Portugal – não terão de pagar a elevada taxa do alvará – e escoando os seus produtos através de outras empresas arrivistas.

C) Franchise: Emancipação de muitas das empresas que actualmente recorrem ao franchise em razão do desaparecimento de barreiras como os elevados capital social e taxa do alvará.

D) Resiliência: Não obstante constituir uma alteração substancial, uma das maiores de sempre, o historial das empresas do turismo revela uma elevada capacidade de resistência às adversidades e superação dos obstáculos.

In Publituris nº 1143, de 12 de Novembro de 2010, pág. 4