quinta-feira, 30 de abril de 2009

Capacidade de carga: um dos instrumentos fundamentais na planificação do território turístico


O futuro do nosso turismo estará ligado a cargas acentuadas ou a modelos de baixa pressão com fraca densidade económica, social, cultural e relacional?


1) O planeamento turístico e a capacidade de carga

A necessidade de uma adequada planificação territorial torna-se mais premente nos territórios em que uma das principais actividades económicas é o turismo.

À luz dos princípios que norteiam o turismo sustentável, os recursos turísticos devem ser adequados do ponto de vista ambiental, economicamente viáveis e socialmente justos.

São conhecidos exemplos de destinos turísticos que atingiram a saturação, outros em que os desequilíbrios territoriais e os fortes impactos produzidos pelo turismo comprometeram fortemente ou até aniquilaram a actividade, mercê da lesão prolongada ou irreversível dos recursos em que assentava a sua exploração.

Com efeito, os recursos ambientais são perecíveis e, em regra, de difícil recuperação pelo que compreensivelmente devem estabelecer-se limites à sua utilização.

O planeamento turístico deve ter em consideração que existe um limite, denominado capacidade de carga turística (capacidad de carga o de acogida del territorio, carrying capacity in the tourism industry, capacité de charge), uma mensuração de quais os limites máximos suportáveis dos diferentes impactos que pode sofrer determinado recurso. Não se trata de uma proibição pela proibição, mas de uma constatação elementar de que o uso excessivo dos recursos pode acarretar a sua destruição, pelo que importa estabelecer limites para a sua utilização e regras para a sua gestão.

Na definição da Organização Mundial do Turismo, entende-se por capacidade de carga turística o número máximo de pessoas que podem visitar determinado local turístico, sem afectar o meio físico, económico ou sociocultural e sem reduzir de forma inaceitável a qualidade da experiência dos visitantes.

2) Alguns exemplos da utilização do conceito

Sem intuito exaustivo, abordo de seguida alguns documentos no qual surge a capacidade de carga.

No estudo sobre o Planeamento Urbanístico da Região do Algarve, de 1965, com a colaboração do célebre urbanista italiano Luigi Dodi, figura um estudo sumário da capacidade de carga de 105 praias algarvias, avançando-se 677 600 utentes dos quais o plano apenas apresenta propostas de utilização para 348 700 utentes, mais de metade ligados a núcleos turísticos a implementar.

No Esboceto (1964), propõem-se 462 100 camas quando o alojamento turístico do Algarve rondava então as 3 000 camas.

Em 1981, surge uma importante iniciativa da CCR do Alentejo, apesar de elaborada como um mero documento de trabalho, intitulada Contribuição para o Ordenamento Turístico da Região Alentejo.

O Plano Nacional de Turismo de 1986-89 apontando a compatibilização do crescimento do turismo com o desenvolvimento equilibrado das estruturas de apoio e de enquadramento, advoga que deve ser privilegiado o conceito de capacidade de carga turística.

Ao nível comunitário, na Resolução do Conselho, de 22 de Dezembro de 1986, relativa a uma melhor repartição sazonal e geográfica do turismo, convidam-se os Estados membros a medir a capacidade de carga nas zonas de acolhimento e trânsito turísticos.

Na Agenda 21 para a Indústria das Viagens e Turismo, uma das medidas preconizadas para o planeamento visando um desenvolvimento turístico sustentável é a colaboração com as autoridades locais e regionais na avaliação da capacidade de carga do destino turístico, considerando os seus recursos mais críticos (solo, água, energia e infra-estruturas), os factores ambientais (preservação dos ecossistemas e biodiversidade) e os factores culturais.

No Plano de Ordenamento Turístico da Madeira surgem referências à potenciação do mar como recurso turístico e de lazer com grande capacidade de carga bem como a ligação deste conceito à rede de levadas e veredas.

No Plano de Ordenamento Turístico dos Açores introduz-se o conceito de capacidade de carga turística, estabelecendo-se a partir do número de camas existentes em cada uma das nove ilhas em 2005 (no total 8093), o número máximo por ilha a atingir até 2015, podendo excluir-se da mensuração duas tipologias consideradas menos agressivas, o turismo no espaço rural e o turismo de natureza.

3) Divisões

De harmonia com a classificação de Mieczkowski (1995), a capacidade de carga pode dividir-se em:

1ª) Capacidade de carga física: número de pessoas que um serviço ou infra-estrutura turística pode suportar mantendo os padrões de qualidade.
2ª) Capacidade de carga ecológica: grau de tolerância dos ecossistemas à actividade turística, o ponto até que esta pode desenvolver-se sem danificar o meio ambiente.
3ª) Capacidade de carga social: é analisada numa dupla vertente, a dos turistas (ponto de saturação a partir do qual procuram destinos alternativos) e a dos residentes (tolerância da população local ao turismo sem gerar tensões relevantes e por forma a que no território também se possam desenvolver outras actividades).

Importa, neste âmbito, estimar a capacidade de alojamento (abrange os turistas e os que residem habitualmente em determinado território), o abastecimento de água, a planificação de habitações e das vias de comunicação.

4) ALL in one

Atílio Forte ocupou destacadamente as últimas edições dos dois jornais com maior projecção no sector, reproduzindo o essencial de uma reflexão cívica sobre a proposta da Lei de Bases do Turismo.

Do meu ponto de vista trata-se do melhor texto produzido até ao momento sobre a proposta governamental, o que a constituir uma excepção à regra de ouro do profícuo silêncio a que se tem votado lhe permitirá figurar no topo do ranking dos potenciais dirigentes associativos, não a curto mas a médio ou longo prazo.

Mário Assis Ferreira, destoa, assim, do dominante temor reverenciALL – os Xutos até divulgaram recentemente no Casino Estoril o seu novo trabalho – mostrando ao sector empresarial que nos seus quadros figura um ainda jovem director que, apesar de provas dadas no passado, continua a saber intervir acertadamente sobre as grandes questões do turismo. Do ponto de vista do grupo, uma jogada exímia na valorização dos seus activos, um pouco na linha do inteligente lobbie, porventura pouco conhecido mas de grande valia para o sector como a conservação das verbas do jogo no turismo ou inflectindo a tendência da Inspecção de Jogos transitar para a ASAE aquando da derrocada institucional associada ao PRACE.

Bem podia a Confederação do Turismo Português ter reivindicado para si, desde a primeira hora, esta velha e reiterada aspiração do seu anterior presidente, associando ao seu património institucional uma das iniciativas mais meritórias do XVII Governo na área do turismo.

Publituris nº 1069, de 1 de Maio de 2009, pág. 4

segunda-feira, 13 de abril de 2009

ALLterações na recta final...


A grande diferença entre um fim sem esperança e uma esperança sem fim passa pela eliminação da asfixia que condiciona o futuro da actividade.


1) O medo, o silêncio e a governação do turismo

A situação económica actual acentua ainda mais um fenómeno preocupante da nossa Democracia: o medo e o silêncio que vai grassando na sociedade civil e a que infelizmente o turismo não escapa.

Não é apenas o cidadão comum mas também os que ocuparam médios e altos cargos no turismo, seja no sector público ou no privado, que me expressam regularmente as suas preocupações e perplexidades perante as diferentes medidas da actual maioria, pedindo expressamente reserva das suas opiniões por temerem ser prejudicados nas suas vidas profissionais.

Mesmo pertencendo ao sector empresarial a atitude de reserva mantém-se porquanto os empresários aos quais se encontram ligados como funcionários ou consultores dependem ou podem vir a depender dos favores do Secretário de Estado do Turismo, do presidente do Turismo de Portugal ou do seu vice-presidente.

Hoje a censura não é mais o esbirro da PIDE que projecta água sobre as vozes subversivas por forma a que não adormeçam na célebre tortura do sono ou que as admoesta até à exaustão com choques eléctricos. É uma censura económica, mais subtil mas igualmente poderosa pois a crítica pode conduzir ao afastamento profissional o qual gera lancinantes insónias perante a impossibilidade de assegurar as suas necessidades básicas.

Prestes a completarmos 35 anos sobre a madrugada libertadora de Abril este estado de coisas numa Democracia europeia tem de ser rapidamente erradicado.

Ocorre-me a este propósito, um texto de invulgar beleza literária da autoria de Manuel Alegre numa homenagem da Ordem dos Advogados a Francisco Salgado Zenha. Num período conturbado da revolução, o Primeiro-Ministro alerta-os para um golpe militar que está prestes a acontecer. Zenha tem então um rasgo característico, convencendo Alegre a escreverem pelos seus próprios punhos comunicados que rapidamente difundem pelas secções do PS mobilizando as bases, frustrando a intentona militar, apesar das dúvidas de Alegre quanto à adequação do método da escrita para travar as pesadas chaimites. O texto encerra precisamente com uma expressão de Zenha aludindo ao poder das canetas como armas que ombreiam com as poderosas chaimites.

Eu também acredito que com a caneta se pode e deve contribuir para erradicar este medo que grassa no nosso quotidiano, o qual paralisa a sociedade e trava o crescimento de Portugal.

2) Apresentação do site da campanha de turismo interno: marketing político de bom nível

Tratava-se de uma acção à primeira vista desnecessária e até contraproducente porquanto o site já existia aquando da apresentação da campanha.

Tendo ocorrido alguns melhoramentos, designadamente o do fundo verde deixar praticamente ilegível o cinzento dos caracteres apontado em anterior artigo, estes por si só não justificavam que pouco tempo após um lançamento em 16 de Fevereiro uma nova ida em 9 de Março, desta sorte ao salão nobre do Ministério da Economia.

A grande novidade era, porém, o maciço e inequívoco apoio do sector associativo empresarial à campanha, em que para além da CTP e da AHRESP pontificou a irreverente APAVT, qual cereja no topo do bolo.

O SET não teve sequer de afectar a sua tradicional elegância e fluidez discursivas, ficando o porventura dispensável remoque para os críticos desta campanha a cargo do vice-presidente da CTP. Pelos meios utilizados estou convencido que a engenhosa acção não envolveu qualquer despesa pública, o que a tornaria reprovável.

A partir de então a única medição da opinião pública desta campanha de turismo interno que conheço (precisamente no site desta publicação) estabilizou e até reduziu as opiniões discordantes.

Curvo-me respeitosamente perante o mentor da inteligente iniciativa e espero que o turismo possa continuar a desfrutar da sua invulgar criatividade e tino político.

3) Lei de Bases do Turismo: os primeiros comentários

Diferentemente do que foi anunciado não me parece que se esteja a cumprir uma promessa, pois não tenho memória que o SET se tenha pronunciado nesta matéria antes da sua apresentação.

A Lei de Bases do Turismo (LBT) foi introduzida no programa eleitoral do PS na área do turismo por Vítor Neto, que aliás o inspirou em boa medida, e daí irradiou para o Programa do Governo.

O grande arauto da medida no sector associativo empresarial foi Atílio Forte, ao tempo presidente da CTP.

Sucede que Vítor Neto foi preterido na governação pelas astuciosas mas míopes manobras de bastidores dos seus correligionários que desembocaram numa sofrível designação dinástica, enquanto Atílio Forte assistiu com dignidade à quebra dos compromissos para a sua reeleição quando os grandes grupos decidiram tomar as rédeas da confederação.

Ambos, no entanto, se agigantaram posteriormente, embora com atitudes diametralmente opostas. O primeiro, pelo incessante labor e destacado eco nos media, é o mais influente comentador do turismo enquanto o segundo numa rara conveniência estratégica entre o dever profissional e interesse político assumiu um silêncio de ouro gerador de invulgares dividendos.

A penumbra política dos seus arautos reduziu automática e drasticamente o fulgor da LBT que de insubstituível jóia programática passou a figurar no baú das promessas bolorentas e votadas ao esquecimento.

Até que em Setembro de 2008 o SET decide proclamar o cumprimento do Programa do Governo.

Voz discordante contrapõe, porém, que o SET se precipitou em tal afirmação, entre outras razões porquanto a LBT figura destacadamente no Programa do Governo e nada havia sido feito nesse domínio, nem sequer um esquiço do seu conteúdo.

Seis meses volvidos sobre o anúncio precoce do cumprimento do programa governamental na área do turismo a apresentação da LBT é anunciada no Congresso da AHP, efectivamente uma grande e inesperada novidade trazida por Bernardo Trindade.

Apanhadas de surpresa a CTP e as principais associações esboçam os primeiros comentários.

Mais prazo pede justificadamente a CTP atenta a importância do estruturante diploma ao que o SET anui, publicando previa e inovadoramente no site do Turismo de Portugal a proposta, o que nunca tinha acontecido anteriormente numa prática política de sigilo legiferante e de interlocutores privilegiados.

É certo que a LBT deveria ter sido consensualizada no primeiro ano da Legislatura, que agora surge como uma atitude meramente reactiva e de cunho eleitoralista, mas como refere o adágio popular mais vale tarde do que nunca e a aspiração da sua publicação tem quase seis décadas.

Importa, pois, que nos próximos meses se possa tratar serenamente as matérias que lá vão ingressar para não criarmos mais entraves desnecessários à actividade económica do turismo.

Basta pensarmos que a definição de turismo constante da proposta, muito criticada aliás, determina a subsequente eliminação de um dos dez produtos estratégicos do PENT, o turismo residencial.

Publituris nº 1066, 10 de Abril de 2009, pág. 4