Recentemente promulgado pelo Presidente da República, em breve ocorrerá a publicação do diploma que contém as alterações à Lei das Agências de Viagens, uma oportunidade inexplicavelmente perdida pelo Governo para suavizar a difícil situação que atravessa este importante sector da distribuição turística e corrigir quanto possível a insólita solução do fundo de garantia solidário em que subsistem aspectos graves, designadamente obstáculos à livre prestação de serviços e distorção da concorrência.
Abandonando-se, sem qualquer explicação, a ideia inicial de uma contribuição anual, em média inferior aos valores actualmente pagos pela caução e proporcional à facturação, o primeiro aspecto negativo respeita à surpreendente criação de uma contribuição única – a designação é enganadora – para o fundo de garantia no montante de 2.500 € que é igual para todas as empresas independentemente da sua facturação, ou seja, tanto paga um grande operador turístico que facture 100 milhões € ou uma pequena agência cuja facturação não atinja 1 milhão €. Para suavizar esta iníqua solução oferece-se o pagamento dos 2.500 € em prestações durante três anos e meio podendo a sorte bafejá-las se, entretanto, o fundo atingir o limite mínimo (2 milhões €) situação em que deixarão de contribuir. Este esquema de pagamento fraccionado da contribuição única que poderia fazer algum sentido para as pequenas agências é, porém, de aplicação generalizada. Cria-se, assim, a expectativa de que não vão contribuir por forma a diminuir o coro de críticas.
O segundo aspecto respeita à mais que questionável solidariedade do fundo – ironicamente associação empresarial e SET são solidárias na sua manutenção – em que as agências saudáveis são chamadas a pagar os erros ou fraudes das suas concorrentes através da denominada contribuição adicional (acresce à contribuição única em consequência da solidariedade). Como se não bastasse esta característica anómala numa economia de mercado (com a particularidade de o CDS/PP defender uma solução colectivista) as agências de pequena dimensão em sede de contribuição adicional pagam proporcionalmente bastante mais que as de grande dimensão. Uma brutalidade nalguns casos: 23 vezes mais se atentarmos no exemplo de uma que facture 49 milhões paga 1.500 € (30 € por milhão facturado) e outra que factura 0,5 milhão que paga 350 € (proporcionalmente 700 €).
As alterações que aguardam publicação violam a Resolução da Assembleia da República n.º 12/2012, mas têm, no entanto, o apoio da APAVT que não se opôs a este clamoroso erro legislativo e vem reiteradamente louvando a actuação da SET, mas nem por isso deixam de ser merecedoras de críticas designadamente pelo carácter iníquo da contribuição única (2.500 € independentemente do valor da facturação) e pela obsessão pela solidariedade que cria objectivamente condições para situações de fraudes designadamente pela parte de prestadores de serviços on-line com impactos extremamente negativos na confiança dos consumidores como vem sucedendo nos últimos meses ao nível europeu. Haverá coragem para continuar o peronista discurso dos descamisados quando estes afinal vão pagar proporcionalmente muito mais que os afortunados?
Publituris n.º 1222, de 10 de Agosto de 2012, pág. 6