Leiria-Fátima ressuscitada e o PENT na gaveta são as grandes novidades.
1) Introdução
Acaba de ser publicado o Decreto-Lei nº 67/2008, de 10 de Abril, que aprova o regime jurídico das áreas regionais de turismo de Portugal continental e dos pólos de desenvolvimento turístico, a delimitação e características, bem como o regime jurídico da criação, organização e funcionamento das respectivas entidades regionais de turismo.
A grande novidade aquando da publicação do diploma legal é, com efeito, a recuperação da Região de Turismo Leiria-Fátima como pólo de desenvolvimento turístico.
À enorme surpresa que constituiu a solução dos cinco pólos previstos no PENT – Douro, Serra da Estrela, Oeste, Alqueva e Litoral Alentejano – aquando da aprovação do diploma em Conselho de Ministros, em 12 de Dezembro de 2007, junta-se agora a da inclusão, já na fase terminal do processo legislativo, de Leiria-Fátima.
Mas há mais: as referências ao sempre enaltecido Plano Estratégico Nacional do Turismo que enxameavam o diploma, quer no preâmbulo quer no articulado, foram pura e simplesmente suprimidas em razão directa da inclusão do pólo Leiria-Fátima.
Ou seja, socorrendo-me da conhecida metáfora parece que a dupla Pinho/Trindade meteu o PENT na gaveta...
Podiam inclusivamente ter aproveitado a ocasião para corrigir a omissão no PENT do turismo religioso como produto estratégico, a qual uma vez colmatada, devolveria a indispensável coerência ao ziguezagueante processo das novas entidades regionais de turismo.
Sequem-se as primeiras notas relativas ao resultado do mais errático processo legislativo da história do turismo português: primeiro, em finais de 2006, dez Agências Regionais de Turismo com base nas NUTS 3, depois em Setembro de 2007 cinco Regiões de Turismo assentes nas NUTS 2, e por fim, a eclética solução dos cinco pólos do PENT a que mão divina adicionou Leiria-Fátima.
2) Treze figuras em vez das cinco anunciadas pelo Secretário de Estado do Turismo para arregimentar apoios das associações empresariais
A opção de fundo do diploma traduz-se na criação de cinco áreas regionais de turismo que incluem toda a área abrangida por cada uma das NUTS II – Nomenclaturas das Unidades Territoriais para Fins Estatísticos de Nível II – numa versão anterior à vigente (artº 2º/1).
Este modelo de base estatística e de imposição governamental substitui o até agora vigente, no qual as actuais dezanove regiões decorrem da vontade concordante dos municípios interessados e do Governo e têm na sua génese critérios de natureza turística, ou seja, os respectivos territórios apresentarem condições e potencialidades para o turismo bem como de afinidades geográficas, ecológicas, históricas e culturais.
Trata-se ainda de uma solução top-down, anacrónica em termos de governança regional do turismo, e também de sinal contrário à até agora vigente em que aos municípios cabia, em exclusivo, o impulso associativo para o plano regional da administração pública do turismo (bottom-up) mas na qual o Governo expressava a sua concordância através do diploma legal (decreto-lei) que instituiu cada uma das regiões de turismo.
Para além das cinco áreas regionais geridas cada uma delas através de uma entidade regional de turismo (artº 3º), que, tal como as extintas regiões de turismo, têm a natureza de pessoa colectiva de direito público, dotadas de autonomia administrativa e financeira bem como de património próprio, são criadas duas situações “ad hoc” para as áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto (artº 2º/2) sob o manto de uma indeterminada contratualização entre a administração central e associações de direito privado.
Há ainda que contar com a novel solução dos seis pólos de desenvolvimento turístico: os cinco previstos no PENT mais o de Leiria-Fátima introduzido numa fase muito adiantada do processo legislativo.
3) Equiparação entre áreas e pólos
Os pólos correspondem a zonas geograficamente delimitadas no interior de cada área regional de turismo e a sua lista figura no anexo ao diploma.
A versão do diploma alegadamente aprovado em Conselho de Ministros, contendo apenas os 5 pólos correspondentes ao PENT, era mais assertiva quanto à plena equiparação do seu estatuto das áreas regionais, os seja, as mesmas atribuições, órgãos, etc.
Não me parece, porém, que o nº 4 do artº 4º tenha afectado a regra da plena equiparação entre área e pólo. Traduz apenas um exercício de cosmética normativa posterior à aprovação em Conselho de Ministros destinado a atenuar o coro de críticas decorrente na inusitada consagração dos cinco pólos do PENT como traves mestras da nova administração regional do turismo português.
Nas atribuições destas pessoas colectivas ocorre um significativo esvaziamento, nada se dizendo, por exemplo, em matéria de promoção ou relativamente aos planos de promoção turística (artº 5º).
Não se prevê qualquer mecanismo para assegurar uma concertação de posições entre a área e o pólo. Ou seja, dentro de uma NUT a direcção da área pode assumir determinada orientação conflituante com a da direcção do pólo ou vice-versa.
Ficam, assim, as primeiras notas relativamente a este desnorte político-legislativo.
A falta de densidade política desta governação do turismo traz-me à memória o dito de Séneca de que não existe vento favorável para o marinheiro que não sabe para onde navega....
Carlos Torres
Advogado
In Publituris on-line – 10 de Abril de 2008