quarta-feira, 24 de julho de 2013

Alterações à Lei da Animação Turística (Decreto-Lei n.º 95/2013, de 19 de Julho)




1) Alterações inspiradas pela Directiva Bolkestein

A Lei da Animação Turística (LAT), aprovada pelo Decreto-Lei n.º 92/2010, de 26 de Julho é alterada, pela primeira vez, através do Decreto-Lei n.º 95/2013, de 19 de Julho, estando fundamentalmente na origem das modificações a Directiva Bolkestein ou dos Serviços que já havia inspirado em 2011 a nova legislação das agências de viagens e da restauração e bebidas. Dada a extensão das alterações – 32 artigos num universo de 42 - podia ter-se optado por uma nova lei mas manteve-se o diploma originário. A vacatio legis é de 15 dias, entrando as alterações em vigor no dia 3 de Agosto (art.º 9º).


Quando actual LAT foi publicada em 2009 já era conhecida a Directiva Bolkestein - Directiva n.º 2006/123/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de Dezembro de 2006 - mas a sua transposição para a ordem jurídica interna só ocorreu no ano seguinte através do Decreto-Lei n.º 92/2010, de 26 de Julho, pelo que haveria necessariamente que introduzir algumas alterações.

De qualquer modo, tal como se reconhece no preâmbulo a LAT foi precursora de um regime simplificado de acesso à actividade de animação turística e apesar de ainda não se impor um sistema de mera comunicação prévia já não se referia a licença como condição do exercício da actividade de animação turística mas a simples inscrição no RNAAT.

Sucede que esse trabalho de adaptação da legislação da animação turística à transposição da Directiva Bolkestein já se encontrava praticamente concluído pelo anterior Governo mas só agora são publicadas. Alegadamente algumas exigências da Troika justificarão este considerável atraso.


2) Pessoas singulares podem aceder à actividade

Deixa de referir-se no art.º 2º a noção de empresa que compreendia o empresário em nome individual, o estabelecimento individual de responsabilidade limitada, a cooperativa e qualquer um dos tipos de sociedade comercial. A eliminação é claramente inspirada em Bolkestein, permitindo que  as pessoas singulares tal como as colectivas também possam aceder à actividade de animação turística. 

Introduzem-se no art. 2º duas alíneas: na a) refere-se a empresa de animação turística enquanto na b) se alude ao operador marítimo turístico. As primeiras, que podem agora assumir a natureza de pessoas singulares ou colectivas, desenvolvem com carácter comercial uma ou várias actividades elencadas no art.º 3º.  Os operadores marítimo-turísticos observam o Regulamento da Actividade Marítimo-Turística (RAMT), prosseguindo alguma das actividades previstas no nº 2 do art.º 4º.

Uma particularidade digna de realce é a de apesar de as duas alíneas operarem uma clara distinção entre empresa de animação turística e operador marítimo-turístico, a primeira realidade compreende a segunda de harmonia com a definição do legislador  [art.º 2º/1/a)].

O nº 2 procede a uma mera actualização do organismo em consequência das alterações introduzidas pelo sucessivos governos. Em lugar do Instituto dos Museus e da Conservação passa a figurar a Direcção-Geral do Património Cultural ou as Direcções Regionais de Cultura.

O nº 3 é novo e, de algum modo, inspirado no nº 2, excluindo também do âmbito de aplicação da LAT as actividades de informação, visitação, educação e sensibilização das populações, dos agentes e das organizações na área da conservação da natureza e da biodiversidade com objectivo de criarem uma consciência colectiva relativamente à importância dos valores naturais.  Devem naturalmente ser organizadas pelos competentes organismos públicos.

3) Nova definição de animação turística. Tipo de actividades

Surge no art. 3º uma nova definição de actividades de actividades de animação turística como as actividades lúdicas de natureza recreativa, desportiva ou cultural, as quais se apresentam numa dupla tipologia: actividades de turismo de ar livre ou de turismo cultural. Ambas as tipologias ou modalidades devem revestir-se de interesse turístico para a região em que se desenvolvam, remetendo-se para uma listagem com carácter meramente exemplificativo plasmada num anexo que integra a LAT.

Explicita o legislador em que consiste cada uma das tipologias.

As actividades  de turismo de ar livre – o legislador avança em sinonímia actividades outdoor, turismo activo ou turismo de aventura – devem obedecer a três requisitos de carácter cumulativo:
1º) Desenvolverem-se pelos menos de forma maioritária em espaços naturais, o que significa que numa parte podem ocorrer em espaços urbanos.
2º) O prestador organiza tais actividades e ou supervisiona-as.
3º) Existe uma interacção física dos participantes com o meio ambiente.

As actividades de turismo cultural promovem o contacto dos clientes com o património cultural ou natural, podendo desenvolver-se em simples percursos pedestres ou implicar o uso de transportes.

A quase totalidade das anteriormente denominadas actividades acessórias são excluídas das actividades de animação turística. Em primeiro lugar, a organização de campos de férias e similares (Decreto-Lei n.º 32/2011, de 7 de Março) depois a organização de espectáculos, feiras e congressos e, por fim, o aluguer de equipamentos de animação, excepcionando-se com os previstos no nº 2 do art.º 4º.  

Eliminada a distinção entre actividades próprias e acessórias que era claramente inspirada no modelo da lei das agências de viagens, a grande distinção é agora entre actividades de turismo de ar livre e actividades de turismo cultural (art.º 3º/2).  Acrescem as actividades de turismo de natureza e as actividades marítimo turísticas (art.º 4º). As diferentes tipologias acarretam, como veremos, taxas diferenciadas que se apresentam agora substancialmente reduzidas.

Para além da distinção entre actividades de turismo de ar livre e actividades de turismo cultural referidas no art.º 3º há que atentar na dupla divisão operada pelo art.º 4º entre actividades de turismo de natureza e actividades marítimo-turísticas.     

Quanto às actividades de turismo de natureza a sua caracterização decorre de dois elementos:
1º) o local onde se desenvolvem: áreas classificadas ou outras com valores naturais.
2º) o reconhecimento dessas actividades de animação turística pelo ICNF.
As actividades marítimo-turísticas caracterizam-se pela utilização de embarcações com fins lucrativos, surgindo uma extensa listagem de modalidades.


4) O acesso à actividade

O art.º 5º corporiza uma substancial alteração deixando de referir-se o princípio da exclusividade, importado da legislação das agências de viagens, que moldou claramente a primeira disciplina da animação turística, o Decreto-Lei 204/2000, de 1 de Setembro e influenciou a actual.  Como se referiu, no art.º 3º eliminou-se a distinção entre actividades próprias e actividades acessórias. 

O acesso à actividade de harmonia com o novo figurino ditado transposição da Directiva Bolkestein, tal como sucede no domínio das agências de viagens e dos estabelecimentos de restauração e bebidas, depende agora de mera comunicação prévia efectuada num registo público, o Registo Nacional de Agentes de Animação Turística (RNAAT). 

Quando a actividade de animação turística pretenda desenvolver-se em áreas classificadas ou outras com valores naturais, terá de ser reconhecida pelo ICNF como turismo de natureza, impondo-se então a comunicação prévia com prazo (art.º 13º).

Se pretenderem exercer com carácter exclusivo actividades marítimo-turísticas, deve ter lugar a inscrição no RNAAT como operador marítimo-turístico, desenvolvendo tão somente as actividades enumeradas no nº 2 do art.º 4º.

Quando nos empreendimentos turísticos, em qualquer das oito tipologias previstas no art.º 4º do RJET, se desenvolverem actividades de animação turística, deve também proceder-se à mera comunicação prévia, excluindo-se tão somente o pagamento da correspondente taxa de acesso à actividade (nº3). No caso de um hotel que realize passeios pedestres ou de btt para os seus hóspedes em áreas classificadas impõe-se a comunicação prévia com prazo.

O exercício da actividade de animação turística por parte associações, clubes desportivos, misericórdias, mutualidades, instituições privadas de solidariedade social e entidades análogas sem inscrição no RNAAT é permitido desde que cumpram um conjunto de requisitos de cariz cumulativo, designadamente não terem finalidade lucrativa e as actividades dirigirem-se exclusivamente aos membros (nº 4).  Devem ainda celebrar um seguro de responsabilidade civil e de acidentes pessoais (nº 5).


5) Entrada gratuita em museus e outros locais no âmbito das actividades

O nº 6 do art.º 5º consagra o direito à entrada livre da pessoa singular ou do representante da pessoa colectiva inscrita no RNAAT aquando do exercício da sua actividade em edifícios ou locais com ela relacionados. As empresas de animação turística que desenvolvam  percursos pedestres urbanos ou visitas guiadas a museus, palácios, monumentos e sítios históricos, incluindo arqueológicos, têm direito a entrada gratuita durante o horário de abertura ao público  nos recintos, palácios, museus, monumentos, sítios históricos e arqueológicos, do Estado e das autarquias locais bastando exibir documento comprovativo da sua inscrição no RNAAT e encontrarem-se a exercer as suas funções.

Permite-se ainda naqueles casos em que a actividade de visita guiada não seja desenvolvida directamente pela pessoa ou representante que figura no RNAAT, mas por um seu trabalhador ou colaborador independente, manter o livre acesso ou gratuitidade, bastando para o efeito uma declaração da empresa contendo a identificação do profissional em exercício de funções complementada com documento de identificação civil (nº 7).

Naturalmente que a gratuitidade é apenas para o representante ou profissional da empresa de animação turística e não para os clientes que integram o grupo da visita guiada.


6) Taxas devidas pelo acesso à actividade

A redução muito significativa do valor das taxas devidas pelo acesso à actividade é um dos aspectos mais significativos do diploma (art.º 16º). Antes da alterações vigoravam 950€ para microempresas e 1500€ para as restantes. Para os operadores marítimo-turísticos 245€.

Os montantes são agora substancialmente inferiores: 135€ para empresas de animação turística e operadores marítimo-turísticos sendo elevadas para 240€ quando pretenderem desenvolver actividades de turismo de natureza. Será de apenas 90€ para as empresas cuja actividade consista exclusivamente no desenvolvimento, em ambiente urbano, de percursos pedestres e visitas a museus, palácios e monumentos. Exige-se, cumulativamente, que se encontrem isentas da obrigação de contratação dos seguros previstos no artigo 27.º, nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 28.º.

Quando se trate de microempresas os valores são ainda mais diminutos: 90€ em geral para animação e operadores marítimo-turísticos, elevada para 160€ quando prossigam actividades de turismo de natureza e 20€ para o desenvolvimento em ambiente urbano de percursos pedestres e visitas museus.

Já os prestadores de serviços doutro Estado membro pagam 75€ quando pretendam prosseguir actividades de turismo de natureza sendo reduzida para 45€ no caso de microempresas. Tratando-se de simples actividades de animação turística ou de operadores marítimo-turísticos ou o desenvolvimento em ambiente urbano de percursos pedestres e visitas museus não é devida qualquer taxa.


7) Seguros

Enumeram-se agora no art.º 27º três tipos de seguros cuja cobertura, capitais mínimos e demais aspectos relevantes, ao invés do que sucedia na versão inicial da lei,  serão posteriormente fixados em sede regulamentar:

a) seguro de acidentes pessoais protegendo os destinatários dos serviços;
b) seguro de assistência quando os destinatários dos serviços viajem  para o estrangeiro;
c) seguro de responsabilidade civil cobrindo os danos (patrimoniais e não patrimoniais) causados por sinistros ocorridos no âmbito dos serviços.

Tal como decorre da transposição da Directiva Bolkestein, as empresas doutro Estado-membro podem fazê-lo também através de garantia financeira ou instrumento equivalente aos seguros anteriormente referidos.

As empresas não podem iniciar a sua actividade sem fazerem prova da sua contratação junto da autoridade turística nacional, devendo também informar da sua revalidação.

Prevêem-se significativas isenções gerais no art.º 28º. Em primeiro lugar, evitando a duplicação, quando as actividades mercê da sua disciplina especial imponham a contratação do mesmo tipo de seguros, depois a realização em ambiente urbano de percursos pedestres e visitas a museus, palácios ou monumentos e, por fim, quando no âmbito da subcontratação a empresa disponha desses seguros.

Abre-se ainda a possibilidade de em sede regulamentar se isentarem mais actividades que não apresentem riscos significativos para a saúde e segurança dos destinatários dos serviços ou de terceiros a menos que pela concreta forma de prestação do serviço assuma natureza notoriamente perigosa.


8) Empresas doutro Estado-membro

Opera-se  no art.º 29º uma distinção entre a livre prestação de serviços por parte de empresas de animação turística doutro Estado-membro desde que com carácter ocasional e esporádico (nº1) e o seu estabelecimento em Portugal (nº2).

Na  primeira situação as empresas doutro Estado-membro não estão sujeitas a qualquer formalismo, enquanto na segunda, ou seja, quando pretendam exercer a sua actividade em Portugal devem efectuar mera comunicação prévia.



Turisver on-line de 22 de Julho de 2013