terça-feira, 1 de setembro de 2009

A Reserva Agrícola Nacional (RAN) e o Turismo


Atente-se na excessiva amplitude do turismo de natureza que, diversamente do que a designação possa sugerir, abarca todos os tipos de empreendimentos turísticos.


O novo regime jurídico da Reserva Agrícola Nacional (RAN) foi aprovado pelo Decreto-Lei nº 73/2009, de 31 de Março, definindo-se como um conjunto de áreas do território nacional que em função de três critérios – agro-climáticos, geomorfológicos e pedológicos – revelam uma maior aptidão para a actividade agrícola.

Trata-se de uma restrição de utilidade pública consubstanciada num regime territorial especial que condiciona, de forma mais ou menos acentuada, utilizações não agrícolas do solo. Não significa, porém, a exclusão ou interdição de outras actividades, designadamente o turismo que podem, em certas condições, ser desenvolvidas nestas parcelas do território.

Existem duas classificações das terras e dos solos, desdobrando-se ambas em 5 classes, mas nem todas integram a RAN, apenas as que se situam no topo. O art.º 6º alude à classificação das terras tendo por base a metodologia recomendada pela FAO – a sua introdução constitui uma inovação do diploma tal como a inclusão da actividade florestal na actividade agrícola – enquanto o art.º 7º estabelece a segunda classificação que assenta na metodologia fixada pelo CNROA.

É no art.º 22º que se estabelecem dois importantes tipos de requisitos para as utilizações não agrícolas, os quais são de aplicação cumulativa.

O primeiro respeita à não existência de alternativa viável fora das terras ou solos da RAN, aferindo-se para o efeito várias componentes: a técnica, a económica, a ambiental e a cultural.

O segundo prende-se com a localização em terras e solos classificados como de menor aptidão, ou seja, a orientação normativa é no sentido de se afectarem as terras e solos com menor aptidão ou capacidade de uso e preservarem-se os de aptidão elevada ou capacidade de uso muito elevada.

Para além disso, as actividades são enumeradas de forma taxativa, ou seja, existe uma filtragem das actividades não agrícolas que podem ser desenvolvidas na RAN.

No que respeita ao turismo são admitidos os empreendimentos de turismo no espaço rural, turismo de habitação e turismo de natureza numa perspectiva de complementaridade à actividade agrícola.

Diferentemente do que se verificou recentemente com o Plano de Ordenamento Turístico dos Açores, em sede de RAN as tipologias encontram-se harmonizadas com o novo Regime Jurídico dos Empreendimentos Turísticos (RJET), aprovado pelo Decreto-Lei nº 39/2008, de 7 de Março que contempla oito tipos de empreendimentos turísticos: 1) Estabelecimentos hoteleiros (hotéis, aparthotéis e pousadas); 2) Aldeamentos turísticos; 3) Apartamentos turísticos; 4) Conjuntos turísticos (resorts); 5) Empreendimentos de turismo de habitação; 6) Empreendimentos de turismo no espaço rural (casas de campo, agro-turismo, hotéis rurais – já não se encontram sujeitos ao limite de 30 quartos ou suites – e turismo de aldeia); 7) Parques de campismo e de caravanismo; 8) Turismo de natureza (art.º 4º RJET).

O turismo de habitação autonomizou-se do turismo no espaço rural e a principal alteração – mantiveram-se as condições arquitectónicas dos edifícios onde se encontram instalados – é poder desenvolver-se para além dos espaços rurais nos urbanos.

O aspecto mais sensível prende-se com o turismo de natureza que no figurino anterior ao RJET compreendia tão somente o turismo no espaço rural e edificações com particulares características arquitectónicas (casas-abrigo) associados a uma baixa carga turística, mas que inclui actualmente todas as tipologias de empreendimentos turísticos designadamente estabelecimentos hoteleiros, conjuntos turísticos (resorts) e aldeamentos turísticos (art.º 20, nº 3 RJET).

Ou seja, a tipologia turismo de natureza apesar da sua designação à partida não o indiciar, engloba tipos de empreendimentos turísticos associados a elevadas capacidades de alojamento, próprias de modelos de elevada carga turística, pouco consentâneas com as limitações de interesse público ínsitas à delimitação da RAN.

Ainda no campo do turismo as instalações desportivas especializadas destinadas à prática de golfe, abrangem não apenas os campos de golfe contemplados na anterior legislação mas também driving ranges, academias de golfe ou centros de estágio com instalações de alojamento e restauração destinadas aos utentes.

Tais instalações devem ainda preencher o requisito da declaração de interesse para o turismo (Decreto-Regulamentar nº 22/98, de 21 de Setembro) e mercê das alterações que estão associadas na topografia do solo não assumam um carácter irreversível que obste à sua eventual reutilização na actividade agrícola.

in Jornal Planeamento e Cidades nº 17, Julho/Agosto 2009, pág. 24